domingo, 24 de abril de 2016

A morte não é nada - Henry Scott Holland

Foto: UNIVERSO - Amanhecer de um dia de outono -  Piedra Roja - Chile 2016

"...a morte não é nada.
Eu apenas passei para o outro lado:
É como se estivesse escondido no quarto ao lado.
Eu sou sempre eu, e tu és sempre tu.
O que éramos antes um para o outro ainda somos.
Liga-me com o nome que você sempre me deu, que te é familiar;
Fala-me da mesma forma carinhosa que tens usado sempre.
Não mude teu tom de voz, não assuma um ar solene ou triste.
Continua a rir daquilo que nos fazia rir,
Daquelas pequenas coisas que tanto gostávamos, quando estávamos juntos.
Reza, sorri, pensa em mim!
Que o meu nome seja sempre uma palavra familiar...
Diga-o sem o mínimo traço de sombra ou de tristeza.
A nossa vida conserva todo o significado que sempre teve:
É a mesma de antes, há uma continuidade que não se quebra.
Por que eu deveria estar fora dos teus pensamentos e da tua mente, apenas porque estou fora da tua vista?
Não estou longe, estou do outro lado, na mesma esquina.
Fica tranquilo, está tudo bem.
Vou levar o meu coração,
Daí acharás a ternura purificada.
Seca as tuas lágrimas e se me amas, não chores mais,
O teu sorriso é a minha paz"

Publicado no FB do Mauricio Vaz

Ponte que não me leva. Ponte que não me atravessa - Rita Alves

Foto: Internet - desconheço o autor - quem conhecer favor informar para que eu possa dar os merecidos créditos

Ponte que não me leva. Ponte que me atravessa.
Ali, onde os castelos são feitos de sonhos, brumas e beijos. Onde a torre guarda jasmins e girassóis. Onde encontramos a linha do infinito cada vez que nos olhamos.
Reparto o pouco que tenho, multiplico o muito que sinto.
Sou o meu próprio avesso, em que me reconheço. Nele me aprofundo, no espelho que atravessa meu contorno.
Ouço o som das águas que inundam minha alma de navegante.
Divida comigo a dúvida do abrigo.
Aguardo deste lado da margem a embarcação, nela está a outra margem.
Multiplico as searas nas múltiplas colheitas.
Distraída passo pela vida sem ser subtraída. Sou meu próprio tempo.
Sei do imensurável fio que conduz a brevidade do tempo.E no infinito deste momento renasço e morro de contentamento
Trago em mim navios e oceanos. Aguardo o silencio. Com ele o desfolhar das horas.
Meu vazio tem imensidão para acolher o novo e tudo o que colecionei ao longo da vida.Os pássaros que me habitam só voltam pela manhã.
Todos os domingos são parques de diversões. Coro de crianças, sorvetes e pipocas, mesmo quando há silêncio em mim. Sim, passam despercebidos aos nossos olhos os momentos mais importantes da nossa vida. Condenso e fortifico minha transparência. Transpareço minha consistência densa. Vou com o vento, volto miragem.
Penso enquanto vivo, vivo enquanto sonho. Retiro véus e me descubro nuvem.
Vou espalhando pelo caminho um pouco do que procuro. Sei que tenho asas mesmo quando não voo. Exclamo, interrogo, reticente...
Faço dos meus olhos bussola e leme. Trago em mim um pouco de cada coisa que não fui.
Dormi com as estrelas florindo a pele, acordei manhã. Meu deserto instaura em meus olhos alguns oásis. E as sílabas soltas flutuam no tempo, escrevendo um livro de sentenças.
Sentir, olhar, observar. Valem mais do que mil páginas lidas ou mais de mil teses escritas.
No verão, percebo os invernos que há em mim. Enquanto navego pelos icebergs da vida, me inundo de calor e cor.
Carrego dentro de mim pincéis e fogueiras. O doce não retira o amargo da boca.
Viajo e vejo minha paisagem interior. Encontro-me nos menores espaços, onde eu possa voar na imensidão do céu.
Aprecio as nuvens. Chuva? Trago o sol dentro de mim. Um pouco de sol, para que clareie a mente e doure o corpo.
Mesmo se caírem as pétalas, as flores espalharão perfume pelo caminho.
Os pés. São meus pés que me conduzem ao meu próprio UNIVERSO criativo.
Pinto um quadro com as tintas liquefeitas da alma. No mais negro dos céus, brilham as estrelas. Meu verso é o vento que espalha o alfabeto.
Não vou a lugar nenhum que me leve para longe de mim.

Dica do amigo: Eric Cohen - Via FB 

AVÓS NÃO MORREM. ELES VIVEM DENTRO DA GENTE - Rebeca Bedone - Revista Bula

Vovó Wal e Matteo - Foto: UNIVERSO

Certa vez, fiquei observando meu pai brincar com meus sobrinhos. Espantada, não era o meu pai que eu via: era o meu avô, o pai dele. O mesmo aconteceu outro dia em que minha mãe sovava a massa do pão: era a mãe dela que eu enxergava, com toda sua força e alegria na cozinha.

Rubem Alves escreveu uma crônica pro seu neto Tomazinho quando este ainda estava aprendendo a falar. No texto, o escritor conta que o menino adorava brincar de cavalinho sentado sobre as pernas do avô: “você brinca de cavaleiro, meus braços segurando os seus, você rindo, querendo sempre mais, e eu cantarolando uma canção que sua bisavó, a Oma, cantava para os netos, em alemão”.

Quando somos crianças, não temos noção de que nossos avós não são eternos. E o tempo passa tão rápido que, de repente, não temos mais os nossos avós por perto. Mesmo com eles ainda vivos, nossa correria diária cheia de compromissos muitas vezes nos faz adiar visitas e reencontros.

Até que um dia surge uma vontade inesperada de comer aquele bolo de laranja gostoso que só a vovó sabia fazer. Rubem Alves sabia disso, ele deixou para o seu neto esta mensagem: “se você tiver vontade de andar a cavalo é porque estará com saudade da perna do seu avô…”.

Hoje eu não tenho mais uma casa de avós para visitar. Infelizmente, os quatro já se foram. Mas os visito constantemente nas minhas saudades. Na casa dos avós podia tudo, mesmo quando eles ficavam bravos com os netos. Lá a gente brincava de “gato mia”, subia no telhado, entrava no jardim. Pegava hortelã e cebolinha da horta para fazer comida para as bonecas. Molhava o pão com manteiga no leite com café. Achava os chocolates escondidos no armário. Brincava com o galinho do tempo que ficava na estante da sala — aquele que mudava de cor dependendo da umidade.

Hoje é fácil perceber como não importava se a vovó trocava o nosso nome ou se o vovô não tinha condições de nos dar um presente caro. Como também não importava se chovia ou se o tempo estava seco (se o galinho estava rosa ou azul). Naquele tempo de ternura, travessuras e simplicidade, o que importava era o colo caloroso de nossos avós. Aquele era o jeito deles brincarem de cavalinho conosco.

Repare como o amor de nossos avós supera o tempo e a distância; eles também vivem em nossos pais. Olhe o seu pai brincando com seus filhos: é o pai dele se divertindo com você e seus irmãos. Observe sua mãe preparando o almoço: é a mãe dela abençoando a cozinha.

De geração em geração, a vida dá seu testemunho: os avós não morrem. A memória do que foi bom e bonito permanece nas partidas de baralho e nas pescarias, no sorvete de groselha e nos sonhos de goiabada, nos panos de pratos bordados por nós e nas histórias que passamos para frente.

Abelhas e Vespas








Fotos: UNIVERSO - CHILE - ABRIL 2016